domingo, 25 de dezembro de 2011

Evangélicos, Bens Materiais e o Capitalismo

Por Marcos Aurélio dos Santos

De fato, a piedade com contentamento é grande fonte de lucro, pois nada trouxemos para este mundo e dele nada podemos levar; por isso, tendo o que comer e com que vestir-nos, estejamos com isso satisfeitos. Os que querem ficar ricos caem em tentação, em armadilhas e em muitos desejos descontrolados e nocivos, que levam os homens a mergulharem na ruína e na destruição, pois o amor ao dinheiro é raiz de todos os males. Algumas pessoas, por cobiçarem o dinheiro, desviaram-se da fé e se atormentaram a si mesmas com muitos sofrimentos. (1 Tm. 6.7-11).

Estas advertências do apóstolo Paulo a Timóteo sobre o perigo do amor as riquezas merece grande atenção de nossa parte. Seu apelo é para que os líderes daquela comunidade valorizassem a piedade e o contentamento para vencer a avareza, pois o amor ao dinheiro poderia levá-los a ruína, sofrimento e por fim, a destruição, levando-os a desviar-se da fé em Cristo Jesus.

O novo testamento está repleto de textos que advertem sobre o perigo do cristão valorizar bens materiais. No conhecido sermão da montanha proferido por Jesus, ele desafia seus discípulos a cultivar valores espirituais e colocá-los acima dos terrenos (Mt 5-7). Amor, justiça, misericórdia, mansidão, humildade e outras virtudes deveriam ser prioridade na vida dos discípulos.  Mais adiante,  após terem recebido do Senhor os valiosos ensinamentos, os apóstolos transmitiram para a igreja o que tinham aprendido do mestre, onde percebe-se nas cartas de Paulo, Pedro e João, como também nos escritos de Tiago, irmão de Jesus.

No livro de Atos dos apóstolos, Lucas nos informa  a maneira simples de como viviam os Cristão da igreja de Jerusalém. Tinham tudo em comum, ninguém considerava os bens como propriedade sua, mas espontaneamente, compartilhava com outros irmãos, viviam de maneira comunitária, estavam seguindo o exemplo de Jesus (At. 2.42-47;4.33-35.NVI).

Pergunto, porque nossas igrejas tem se tornado cada vez mais capitalista enquanto uma das marcas do verdadeiro cristão é a simplicidade e o compartilhar? Porque temos sérias dificuldades de nos conformarmos com o que temos, mas gradativamente temos nos tornado escravos do consumismo?   Porque estamos sempre em nossas orações pedindo coisas matérias, onde raramente, praticamos a oração da intercessão, do perdão, da confissão? 

Ao contrário da igreja primitiva, onde todos viviam juntos e  tinham tudo em comum, algumas denominações se separaram das camadas mais pobres da sociedade, formando igrejas elitizadas, onde não há espaço para os desfavorecidos. Promovem festas internas, investem em construção de mega-templos, líderes engordam seus salários em detrimento dos mais pobres.

Certa vez fiquei chocado com uma declaração de uma irmã sobre um grupo de crianças pobres que eram assistidas por um grupo de ação social.
Sem nenhuma piedade ele falou que odiava aquelas crianças, pois elas eram barulhentas e mal comportadas. Para aquela irmã e para um bom número de membros daquela igreja, as crianças eram um grande incômodo.  Lamentavelmente o grupo de “crentes”(Não todos) daquela comunidade conseguiu excluir o trabalho social da igreja e as crianças nunca mais voltaram.

Exemplos negativos como estes, que estão longe de refletir a imagem de Cristo na sociedade, revelam um dos aspectos do espírito capitalista de nossas igrejas. Temos facilidade de agendar e investir em programações anuais , e como tem programação: Aniversários,  encontros, reuniões administrativas,  e por ai vai, no entanto, a assistência aos necessitados, sustento de missionários e outros investimentos relevantes deixam de ser prioridade.

A relação de Capitalismo = gerar Capital, busca por Capital, "Riqueza Financeira" e a busca por bens materiais no meio evangélico, tem produzido igrejas consumistas, onde a maneira de se relacionar com Deus centraliza-se no ter. ter carro do ano, ter casa própria, Ter uma boa conta bancária, não há espaço para a relação do ser, ou seja, os evangélicos gradativamente tem perdido a visão de construir um relacionamento com Deus com objetivo de ama-lo, adora-lo, conhecer e seus atributos, em fim, devemos nos relacionar com ele não simplesmente pelas bençãos materiais recebidas, mas pelo que ele é. 

A metodologia de mercado exercida pelos adeptos da teologia da prosperidade também demonstram fortes sinais do capitalismo na igreja evangélica. O evangelho é encarado como mercadoria negociável no mercado. Os métodos não são diferentes dos praticados pelas grandes empresas do comércio.  Alvos e metas a serem alcançadas, estratégias para alcançar consumidores em potencial, construção de templos em locais estratégicos, ênfase no pastor fenômeno, inovações nos produtos oferecidos, são verdadeiras empreses em potencial que lutam numa concorrência absurda por espaço no meio evangélico.

Nesse tipo de negócio, o alvo é atrair mais clientes, que conseqüentemente, numa visão capitalista, aumenta a entrada de capital, que por sua vez será investido em matrizes nos lugares estratégicos. É neste cenário que surge as igrejas chamadas flutuantes, que produzem crentes sem fundamentos doutrinários seguros, sendo levados pelas inovações desses movimentos. São crentes motivados pelo consumismo. A lógica é, onde estiver novidade, os membros se deslocam de suas denominações em busca de novos produtos para satisfazer seus desejos de consumo.

A influência do capitalismo também é encontrada na entrega dos dízimos e ofertas em algumas de nossa igrejas. O apelo da pregação é que o indivíduo deve entregar o dízimo ou ofreta, e esperar retorno financeiro. O dízimo transforma-se em um investimento, onde o fiel deve aguardar o lucro financeiro do que foi investido. Muitos crentes encaram a relação com Deus como uma maneira de obter bens materiais e aumentar seu capital. 


Para muitos, Deus é visto como uma especie de bolsa de valores, de fundos de investimento financeiros. Negociam com Deus centrados numa relação comercial, onde o alvo é a prosperidade financeira. 


É lamentável ver nossas igrejas trilhando caminhos bem diferentes, distantes dos ensinamentos de Jesus. O verdadeiro investimento que a igreja deve buscar, são os valores espirituais seguindo as pisadas do mestre quando disse: "Não acumulem para vocês tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem destroem, e onde os ladrões arrombam e furtam. 
Mas acumulem para vocês tesouros no céu, onde a traça e a ferrugem não destroem, e onde os ladrões não arrombam nem furtam. 
Pois onde estiver o seu tesouro, aí também estará o seu coração (Mt.6.20-21.NVI). 

O amor as riquezas, o consumismo e nossa visão capitalista, como um câncer que destrói as células que mantém nosso corpo equilibrado e com vida, pode destruir nossa fé que há em Cristo Jesus. As advertências, tanto de Jesus como dos apóstolos sobre a questão são sérias e, portanto devem ser refletidas de forma constante em nossa caminhada cristã. 

Devemos nos empenhar na busca e valorização dos tesouros celestiais que estão preparados para a igreja do Senhor no grande dia da sua vinda. Aguardar esse grande dia diligentemente, priorizando o reino de Deus e sua justiça, fazendo o bem, acolhendo, amando, perdoando, semeando a boa semente na expectativa de colher bons frutos, voltando ao primeiro amor, cultivando a comunhão, a oração, a doutrina de Cristo, o partir do pão, nisto devemos perseverar.

Que nosso coração seja preenchido com essas virtudes para que não haja espaço para o dinheiro,enquanto no capitalismo a Busca visa entrada de capital, a igreja deve permitir a entrada do Espírito Santo para que Cristo seja glorificado. É o Deus encarnado habitando em nós e nós nele, é Deus dentro do homem e o homem dentro de Deus sendo participantes de Sua divindade por meio do filho, que numa atitude de humilhação se fez carne e habitou entre nós(Jo.1.1). 

Que o poder de Cristo operando em nós, no exercício da piedade e do amor ao próximo possa sufocar os males que estão dentro de nós, que o Deus da eternidade seja glorificado por meio de sua igreja, em nós não há nada de bom, mas somente em Cristo a bondade é manifesta, em nosso coração está a avareza, mas em Deus encontramos o verdadeiro tesouro.

Somente nele e por ele podemos nos libertar da escravidão do capitalismo, a verdadeira felicidade não é encontrada em vitrines ou em pacotes nas prateleiras, ela não é objeto de consumo, mas bem aventurados os que confiam no Senhor, pois verdadeiramente serão chamados bem aventurados,  pois nossa felicidade está em Deus. Que o Senhor nos ajude.
           
                                                                                    

3 comentários:

  1. Grande abraço irmão Marcos Aurélio. Este texto de sua autoria é um grito que não quer e nem pode ser calado. Os princípios básicos do cristianismo está sendo deixado de lado, tudo em nome da prosperidade e nos molde do capitalismo selvagem, que vemos que é maléfico a nossa fé e sã doutrina. Parabéns pela sua iniciativa de não se calar e nem de se dobrar ao "sistema"... aproveitando feliz ano novo pra te a para tua família, um excelente 2012.

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    1. Parabéns pela iniciativa, Estar acontecendo um verdadeiro mercantilismo da fé, os verdadeiros cristãos, precisam dar início a um movimento de reforma.

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  2. Interessante ensaio... mas na minha leitura o que ocorre é um exacerbamento de uma cultura que está na origem do protestantismo. Capitalismo e protestantismo nascem num mesmo contexto histórico e com propósitos de mesma base.

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