domingo, 27 de agosto de 2017

E Se Jesus Fosse Morador de Jardim Progresso?




 Por Marcos Aurélio dos Santos

 Que dia lindo! Que momentos agradáveis. Pela manhã caminhei e visitei alguns dos moradores da comunidade de Jardim Progresso. Fui bem acolhido em meio a recepções simples com afagos, abraços e apertos de mãos. Tive um momento de prosa com algumas pessoas, acenei para outras e dei um bom dia. Confesso que sou apaixonado por esta comunidade na qual já caminho a mais de 10 anos. Fiz muitos amigos e amigas. Conheço vários dos seus moradores e moradoras, e, uma das coisas que mais gosto de fazer é debruçar meus ouvidos e ouvir suas histórias. Algumas delas são cheias de alegria e esperança mesmo diante de um contexto de desigualdade social em que vivem, outras são marcadas por tragédias, dores e perdas. Alguns aparentemente perderam a esperança, mas não totalmente pois a esperança não morre.  


Ao chegar em casa passei a refletir. Então me veio uma questão. O que Jesus faria como morador da comunidade de Jardim Progresso? Como viveria? Em que ele ocuparia o seu tempo? Que espaços ocuparia? Não são perguntas fáceis se enxergarmos somente o Jesus glorificado. Contudo se olharmos para o Jesus de Nazaré, o Galileu que viveu entre os pobres e favelados da Palestina encontraremos uma pista. Podemos começar a partir da vida simples do Deus humano, do homem de Nazaré.


Em Jardim progresso Jesus não habitaria na casa mais estruturada e segura do bairro, cercada com um grande muro com altura elevada e portão eletrônico. Sua morada seria uma simples e bonita casa sem muro, com um belo jardim onde todos pudessem chegar e se assentar junto a ele e ouvi-lo. Seria uma casa sem porta onde todos poderiam entrar, se aproximar até a sala de jantar e ao redor da mesa cear junto com ele. Não seria uma casa triste pois todos se alegrariam de maneira comunitária. Tudo seria comum. Cada um traria um bocado para juntos partilharem em amor junto à mesa com Ele em meio a abraços e sorrisos. É a celebração da vida!


Certamente Jesus também não passaria a maior parte do dia em sua casa. Não hesitaria em caminhar pelas ruas empoeiradas de Jardim Progresso. Não para passar o tempo ou para descontração, mas para ver, julgar e agir diante da realidade social, política e econômica da comunidade. Jesus certamente buscaria em Deus respostas para a atual situação de exclusão de seus vizinhos e moradores. Iria ao encontro dos mais necessitados e excluídos. Seria uma prioridade! Não ficaria calado diante da falta de saúde, educação, alimentação básica, segurança, transporte e moradia. Seria um morador comunitário-libertário que lutaria pela solidariedade entre as pessoas e pelo amor político. Seria um morador amável, misericordioso, solidário e cheio de sonhos.


Com as crianças de Jardim Progresso, Jesus agiria da mesma forma como faria com os adultos. Acolheria todos os pequeninos. Os chamaria para uma pelada no fim de tarde, envolvia-se com eles em suas brincadeiras, passeava de bicicleta ou de carroça, assentava-se junto a uma calçada ou debaixo de uma árvore frondosa para contar e ouvir histórias, ensinava-lhes sobre cidadania, amor e justiça. Iria até a mercearia ou na padaria do “Boca” comprar pão, bolo e suco para um lanche da tarde com a meninada e celebraria uma linda ceia mirim! Convidaria todas as crianças para visitar sua casa, ofereceria um espaço para que pudessem sentar-se na grama do jardim e ouvir uma linda poesia, um conto, uma parábola, uma palavra de fé e esperança em um mundo de exclusão e desigualdade. Diria para eles que deles é o Reino dos céus e que este Reino está presente na comunidade de Jardim Progresso. Aconselharia aos pequeninos e serem bons alunos na escola e que fossem obedientes aos seus pais.


Jesus não seria um frequentador fiel do grande templo central da avenida principal do bairro no culto de Domingo. Não seria mais um religioso morador de Jardim Progresso. Seu púlpito seria as ruas, esquinas, escolas, mercearias, barraquinhos, quitandas, paradas do buzão e becos da comunidade. Não estaria disposto a ser um protagonista de mais uma hierarquia religiosa no bairro onde os interesses se limitam a lamentável visão de “ganhar almas”, construção, reformas de templos e disputas acirradas por adeptos para acréscimo numéricos à suas denominações. Ninguém iria encontrar Jesus assentado em uma cadeira especial no templo central, pois estaria gastando tempo e energia junto com os pobres e excluídos.  


Jesus de Nazaré nos convida para caminhar com ele em nossas comunidades. Nos chama para lutar ao lado dos excluídos, acolher a todos, se alegrar com as crianças e ouvir as pessoas. Jesus nos convida e se assentar com Ele no jardim da solidariedade, com pé no chão, e juntos construirmos um mundo melhor onde habite o amor e a justiça.



   

domingo, 21 de agosto de 2016

A Rio 2016: As Olimpíadas dos Excluídos



Por Marcos Aurélio dos Santos

Muitos brasileiros e estrangeiros ficaram perplexos com a magnitude da abertura das olimpíadas. Um show de cores, um espetáculo que atraiu milhares de pessoas dos quatro cantos do mundo. É uma festa mundial. Nossos atletas se preparam para as provas, cheios de orgulho e vontade de vencer, o que é louvável. Muito treino e dedicação motivados pela busca de uma medalha ainda que com pouco incentivo e investimento do estado. Um forte aparelhamento de segurança bem articulado, uma cena pouco vista nas ruas do Rio de Janeiro. Então, muitos dos participantes e organizadores ousam dizer: “Está tudo perfeito! Tenho orgulho do meu País! ”. “Essa Olimpíada vai ficar na história”! Será mesmo?


A tocha olímpica também teve grande destaque. Percorreu o país, ainda que em meio a muitos protestos e até prisões de alguns que ousaram de forma corajosa apagá-la sem sucesso. A segurança em torno da tocha reprimiu com rigor os “malfeitores”. Uma tocha que percorreu o Brasil teve mais cuidado e atenção do que um maratonista ou um boxeador que com muito esforço e treinamento intenso busca representar com ética e amor o seu país. A tocha vale mais do que o atleta!


A Rio 2016 é um jogo para as elites. Neste evento olímpico não há espaço para os excluídos. Podemos dizer que a olimpíada realizada no Brasil são os jogos dos esquecidos e sem voz. Um ingresso para assistir uma final do futebol masculino custa em média 6.000.00 Reais, uma camiseta simples do vôlei custa 200.00$. É um evento para satisfazer o consumo alienado da burguesia capitalista. O custo atualizado da Rio 2016 é de 38,26 Bilhões. Um gasto exorbitante para satisfazer uma minoria em detrimento de milhões de esquecidos.


Em meio ao grande espetáculo mundial e um gasto absurdo urge uma denúncia. Justiça! Faço minhas as palavras do Rio de Paz, (uma ONG liderada pelo pastor Antônio Carlos Costa), qual o legado para o pobre? E assim acrescento com outras perguntas: Porque bem perto dos jogos olímpicos barracos são incendiados nas favelas, crianças continuam sendo assassinadas, outras brincam às margens de rios poluídos cheios de lixo,outras são vítimas de bala perdida, adolescentes são estupradas e mortas, mulheres e homossexuais são violentados brutalmente, Porque? Qual o legado?


Certamente não haverá medalhas para os excluídos a não ser o choro da lamentação em meio a dor. Isto porque os pobres das favelas do Rio não querem entrar no Maracanã ou no Maracanãzinho para assistir as finais dos jogos de volei e futebol, nem ocupar os lugares mais caros para assistir Bolt vencer todas as provas. Não! Eles querem dignidade e respeito! Querem segurança, saneamento básico, boa alimentação, boas escolas e hospitais equipados com bom atendimento. Eles querem justiça! Aliás, Deus não está sendo glorificado nos jogos como ecoou em alguns discursos de atletas evangélicos brasileiros, como também a postura do Jogador da seleção Neimar, com a faixa na cabeça que dizia 100% Jesus. Não! Deus não é glorificado onde há injustiça, o nosso Deus é o Deus da Inclusão!


A Rio 2016 está perfeita para a elite e grandes autoridades do esporte e da política que insistem em fechar os olhos para enxergar o pobre, para os egoístas que se apressam para satisfazer seus desejos desenfreados de consumo, para os gringos que não conhecem e não vivem na pele o sofrimento do pobre latino americano. Esta é a voz do povo! Queremos Justiça!  



    

  

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Os da Religião e os Seguidores de Jesus



Por Marcos Aurélio dos Santos

A religião é constituída por ritos, dogmas e códigos. No mundo há vários segmentos religiosos, e, dentro das religiões percebe-se uma diversidade neste sentido. Os sistemas são influenciados pela cultura de cada povo. Nenhuma religião, de uma forma ou de outra está imune a influência de outras religiões, inclusive na religião cristã. A religião é uma invenção humana, ela não é de origem divina. Ela já existia antes de Jesus. Por isso Jesus foi rejeitado pelo sistema religioso dos Fariseus e considerado um herege profanador da religião judaica. Ser adepto de uma religião é uma coisa, e ser seguidor de Jesus é outra. Em um contexto religioso, podemos perceber a manifestação dos desvios da vontade divina em suas diversas formas.


Os da religião se apressam na busca para satisfazer seus próprios desejos egoístas. Suas palavras e ações giram em torno de si mesmo em detrimento do amor próximo. A satisfação pessoal, a realização de projetos que não inclui o outro, a busca do ter, o sucesso a qualquer custo, são alvos de um indivíduo religioso, pois suas motivações estão centradas no egoísmo, que é contrário ao amor.


Os seguidores de Jesus são diferentes. Eles são comunitários. Em sua caminhada, aprendem a repartir, não constroem sua espiritualidade no que possuem mas entendem que tudo que eles têm de bom, é empréstimo de Deus. Quem caminha com Jesus compreende que o pão não é individual, mas de todos. Assim como Deus é nosso, o pão também é.   


Os da religião valorizam demasiadamente a lei (no sentido de punição) em detrimento do amor. Para um religioso, a lei que pune está acima da misericórdia. Para eles, Deus se agrada daqueles que cumprem rigorosamente os preceitos estabelecidos pelo sistema, ainda que isso custe um ato de injustiça para com o próximo.


Quem enxerga apenas o sistema religioso com seus ritos e dogmas, aborrece a misericórdia, que é uma virtude do amor. Aplicar leis de pena sem misericórdia a todo custo, sem olhar para situação de sofrimento e dor dos esquecidos e dos mais fracos, demonstra a ausência de amor. Foi isto que Jesus propôs para o doutor da lei farisaica ao contar a história do bom samaritano. Para Jesus, acolher o próximo e amá-lo é superior à lei e ao templo. O amor é a marca de identificação do discípulo.


Assim são os discípulos de Jesus. Tem o amor como base para a vida, são imbuídos de misericórdia e estão em uma constante busca para imitar o Jesus de Nazaré. Querem ser em seu dia a dia ser mais parecidos com Jesus. Amam sem a exigência de ser amado, estão dispostos a levar a cruz, decidiram viver não mais para si, mas para os outros.  


Os da religião travam entre si uma disputa pelo poder e glória. Estes não admitem estar em uma posição de baixo escalão, querem sempre estar no topo. São os ególatras da religião. Tudo que acontece no ambiente onde eles dominam deve girar em torno deles, temem seus adversários que porventura possam tomar o seu lugar de honra e poder. São manipuladores e não admitem serem questionados. Querem sempre ocupar os lugares mais privilegiados, as melhores cadeiras e fazem questão de se destacar na aparência entre os demais.


Consideram-se superiores aos outros. Não admitem diálogos que comprometam seu corpo de doutrinas estabelecidas, determinam tudo e se fazem donos da verdade divina. Nestes ambientes as ações dos menores giram em torno de um pedido de permissão que na maioria das vezes são descartadas. A última palavra é sempre de quem está no topo de hierarquia de poder.


Com os seguidores de Jesus não é assim. Não há dominadores e detentores do poder e da verdade. Toda honra e glória é dada a Jesus, o único Senhor de tudo e de todos. Entre os do caminho prevalece a submissão mutua, o serviço, a simplicidade e a humildade.


O que pretende ser o maior, antes seja o menor, e o que busca ser o primeiro, deverá se contentar em ser o último dentre todos. Em vez de disputa por poder e glória, o discípulo busca ser um imitador de Jesus. Deve lavar os pés uns dos outros, ser servo de todos, usar de misericórdia para com todos, e ser submisso a Deus. Deve ser um profeta multiplicador da paz, da verdade e da justiça.


Na religião há uma total ausência de compaixão pelos que sofrem. O religioso opressor não tem nada a oferecer aos pobres do mundo a não ser seu sistema de opressão. No sistema religioso os pobres são esquecidos porque não tem muito a oferecer, não tem voz e não possuem recursos que atendam aos interesses da religião. Não seria esta a razão que a maioria dos cargos de poder em algumas igrejas brasileiras estão entregues aos mais abastados? Ou seja, grandes empresários e políticos de renome nacional? E se não bastasse, muitas das vezes os pobres entregam os poucos bens que possuem e são iludidos por uma falsa esperança de uma vida próspera.  


Por isso a religião é um dos sistemas de opressão contra o pobre. Só tem acesso aos benefícios e recursos da religião os mais abastados, os que fazem acordos, os que se submetem ao sistema, ou os que comungam com ele.


Quem apoia a opressão do seguimento religioso é amigo da injustiça. Calar-se diante do sofrimento e dor dos sem voz é andar em parceria com a iniquidade. Isto demonstra a ausência da compaixão na religião. Ao oprimido só resta uma alternativa: recorrer ao Deus da justiça, clamar por misericórdia para que a justiça do Reino prevaleça em meio a opressão dos “senhores da religião”.   


Ao contrário, os seguidores de Jesus são os que caminha na trilha da compaixão.  Acolhem o pobre, falam a favor dos que não tem voz, recebem os marginalizados, moradores de rua, homossexuais e prostitutas. Os seguidores de Jesus caminham ao lado dos que sofrem. Os discípulos de Jesus de Nazaré denunciam a opressão e os sistemas dominadores do poder. Estão imbuídos da profecia, não se dobram ao poderio devastador e desumano das trevas.


Os “senhores da religião” buscam viver uma vida de ostentação. Ostentar é o contrário da simplicidade. É o prazer em demonstrar para os outros os bens que possui de forma exibicionista. Os religiosos adoram ostentar. Possuir relógios caros, andar em BMW e HILUX, vestir-se de ternos finos para o culto de Domingo e frequentar hotéis e restaurantes da alta classe. O religioso esbanja seus bens para satisfazer seus desejos de consumo em detrimento dos miseráveis que por muitas das vezes, são encontrados nas calçadas dos grandes tempos. Ostentar é um ato de injustiça contra o próximo.


Quem quer ser seguidor de Jesus não pode viver uma vida de ostentação. Em vez disso, devem conformar-se com as coisas mais simples e repartir. Viver o comum. Compartilhar suas posses com os que sofrem e desprender-se de Mamom, o deus da avareza e da idolatria, identifica os seguidores do homem de Nazaré, o servo sofredor, que não tinha onde repousar a cabeça.   


Então, percebe-se a distância entre ser um religioso e ser um seguidor de Jesus de Nazaré. Não há nenhuma possibilidade de unir as duas vertentes. Só há dois caminhos. Trilhar pelo caminho do Cristo ou da religião. Estes são totalmente opostos. Os de Jesus sempre irão optar pela simplicidade e humildade, pela compaixão, pelo serviço, doando-se ao outro e não se curvarão diante dos desejos do sistema religioso.


Ser seguidor de Jesus é caminhar com Deus e com o nosso próximo.