Por José Egberto Sátiro de Moura
Para compreendermos bem a
expressão de fé da Igreja de Cristo no Brasil, precisamos entender a diferença
entre Luteranismo e Calvinismo. Tanto um quanto outro fazem parte da Igreja
histórica e reformada. A formação de Martinho Lutero foi feita de filosofia e
teologia; Calvino recebeu uma formação humanís-tica, era de família camponesa,
mas, o pai de Calvino era um tabelião que fez do filho um membro da classe
profissional.
Enquanto João Calvino foi organizador por excelência do
protestantismo, Martinho Lutero foi a sua voz profética. Lutero era fisicamente
forte, enquanto Calvino teve de enfrentar problemas de saúde durante todo o seu
período de trabalho em Genebra.
Martinho Lutero amava o lar e a família, ao passo que
Calvino preferia o estudo solitário. Lutero vivia na Alemanha monárquica, e
esperava o apoio dos aristocratas e príncipes; Calvino, numa Suíça republicana,
interessava mais pelo desenvolvimento de uma igreja governada
representativamente.
Enfim Lutero e Calvino diferiam tanto teologicamente
quanto pessoalmente. Lutero enfatizava a Pregação; Calvino preocupava-se com a
formulação de um sistema formal de teologia. Os dois aceitaram a autoridade da Bíblia,
só que a ênfase maior de Martinho Lutero era sobre a justificação pela fé e a
de Calvino, sobre a soberania de Deus. Lutero rejeitava o que a Bíblia não
aprovava; Calvino rejeitava o que não pudesse ser provado na Bíblia.
Lutero aceitava a predestinação dos eleitos, mas se
preocupava muito pouco com a eleição para a condenação. Calvino, por sua vez,
defendia uma eleição dupla, para salvação e para condenação, baseada na vontade
de Deus, e rejeitou qualquer concepção da salvação como fruto do mérito do
eleito ou da presciência de Deus, como se Deus elegesse para a salvação aqueles
que ele sabia de antemão que creriam.
Tanto Lutero quanto Calvino conheciam bem as posições
bíblicas e filosóficas de Santo Agostinho de Hipona. Desde o Século XVI, com o
movimento da Reforma os cristãos reformados aprenderam a resumir a doutrina da
salvação em cinco pontos doutrinários que é histórica e calvinista, e nesse
contexto Calvino foi quem teve a oportunidade de sistematiza-las. No entanto a
nossa base doutrinária não foge desse padrão.
Quando fazemos um paralelo da doutrina reformada com os
principais pontos doutrinários da Igreja de Cristo no Brasil, chegamos à
conclusão que os nossos pioneiros estavam convictos da base de fé reformada.
Esta não é diferente da que nós defendemos: vejamos os cinco pontos
doutrinários calvinistas e os principais pontos da nossa expressão de fé:
Primeiro, a depravação total do homem. Esta doutrina bíblica ensina que todos
os homens são pecadores e estão destituídos de qualquer bondade espiritual.
Todos pecaram e destituídos estão dada glória de Deus (Rm 3.9-23; Sl 14; Mc
7.21-23) Sob o pecado estão mortos espiritualmente, corrompidos e não podem realizar
qualquer bem ou mesmo voltar-se para Deus.
De acordo com o quinto ponto da nossa expressão de fé,
cremos na pecaminosidade universal e a culpabilidade de todos os homens desde a
queda de Adão início da ira de Deus e a condenação de todos os homens, e
citamos uma base bíblica que não é diferente: vejamos que a argumentação tem
uma boa base bíblica. Gn 2.16-17; 3.1-24; Rm. 3. 9-23; 5.12-21; 6. 23; Hb.
9.27. Vale resaltar que é uma doutrina defendida desde Santo Agostinho até a
sistematização de Calvino.
Em segundo lugar a doutrina calvinista defende a eleição
incondicional, nossa Igreja defende justamente a mesma base doutrinária. Esta
doutrina permeia toda Bíblia predestinação refere-se ao propósito soberano de
Deus, de predestinar àqueles homens que serão salvos (Rm 8.29; 9.11-13; Ef
1.9-11). A predestinação é a base da salvação e inclui a eleição e reprovação.
Neste ponto da eleição incondicional, também a nossa
doutrina não é diferente. Na nossa expressão de fé, no primeiro ponto
doutrinário cremos na justificação pela fé, salvação eterna do crente, sem
concurso do mérito próprio. A justificação do pecador é somente pela graça de
Deus, na suficiência do sangue remidor de Jesus Cristo, com eterna segurança do
cristão. Citamos Jo 10.27-29; Rm 8.1-2, além dos versos 31-39 de Romanos e Ef
2.1-9. O segundo ponto de nossa expressão de fé também faz parte dessa eleição
incondicional, notemos que temos apenas mais referencias bíblicas sobre o
assunto abordado nos mesmos livros do Velho e Novo Testamento.
Em terceiro lugar a expiação limitada é o terceiro ponto
apresentado na doutrina calvinista. Esta doutrina afirma que Jesus Cristo
morreu para salvar suas ovelhas, ou seja, os eleitos de Deus e não pelo mundo
inteiro. Aqueles por quem sofreu e morreu são chamados de minhas ovelhas. (Jo
10.11,26); sua Igreja (Atos 20.28; Ef 5.25-27). Nesse ponto também não somos
diferentes.
No sexto ponto doutrinário da nossa base de fé, vejam o
que dizemos: Cremos na redenção da culpa, pena, domínio e presença do pecado,
somente por meio da morte expiatória do Senhor Jesus Cristo, no Sangue do
Unigênito Filho de Deus, nosso representante e substituto. Rm 3.24; 4.25;
5.6-10; e I Co 1.30 e 15.50-57. Observem que o que dizemos é como se
estivéssemos respondendo a questão acima que é um dos pontos calvinista.
José Dantas filho, Pastor da Igreja de Cristo em Mossoró
Rio Grande do Norte, ao se referir sobre os motivos que levaram a saída dos
pioneiros da Assembleia de Deus, relatou no livreto Bosquejo Histórico falando
sobre a história dos evangélicos em Mossoró. Ele afirma respondendo ao que
pensavam os pioneiros que o crente é justificado pela fé em Cristo Jesus
segundo Rm 5.1-2, sendo assim o crente está salvo para sempre, ainda que venha
cair em erros, como aconteceu no passado com vários servos de Deus, e ainda
acontece hoje com muitos deles, o Senhor Jesus Cristo mesmo garantiu esta
certeza de salvação aos que nele cressem quando declarou as minhas ovelhas
ouvem a minha voz, e eu as conheço, e elas me seguem; e dou-lhes a vida eterna,
e nunca hão de perecer e ninguém as arrebatará da minha mão. Jo 10.27-28.
Assim, o crente pode, devido as suas fraquezas espirituais, cair em pecado,
desviar-se dos ensinos cristãos, mas não perderá a salvação que lhe foi
outorgada gratuitamente pelo Filho de Deus mediante a fé depositada em Jesus
Cristo e no seu sacrifício realizado na cruz do Calvário em favor do próprio
pecador perdido em seus pecados.
Ele afirma de acordo com essa doutrina que se fosse
possível perder a salvação e adquiri-la de novo mais tarde, como pregam alguns,
também seria necessário haver um novo nascimento, ou mesmo terceiro ou quarto,
conforme o caso, o que é totalmente impossível à luz do Novo Testamento. Esta
segurança eterna da salvação do crente é ainda confirmada na palavra de Deus em
textos como os de Jo 3.16 e 36; 5.25-26, além de outros versículos que tiram
muitas dúvidas acerca do assunto inserido no Novo Testamento.
Nesse contexto ele relata: O que acontece com o crente
desviado da sua fé, ou na sua conduta cristã, é que ele um dia, sinceramente
arrependido do seu erro praticado, voltará, como aconteceu com o filho Pródigo
da parábola contada por Jesus Cristo em Lucas 15. 11-32, a casa do seu pai e
será maravilhosamente recebido por ele, de braços aberto, completamente
perdoado com muita alegria, continuando salvo como antes de se afastar-se da
vida cristã normal. Ele conclui que diante de tais ensinamentos sobre a salvação
do crente genuíno, o grupo entrou em desacordo com a doutrina pentecostal
aceita pela Assembleia de Deus, da salvação Transitória.
O quinto ponto doutrinário calvinista é a perseverança
dos santos, ou segurança eterna justamente como nós cremos: este ponto sugere
que aqueles a quem Deus chamou para salvação, e depois, a comunhão eterna com
ele (santos segundo a Bíblia) não podem cair em desgraça e perder sua salvação.
Mesmo que, em suas vidas, o pecado os leve a renunciar à sua profissão de fé, (se
eles são autênticos eleitos), mais cedo ou mais tarde, retornarão à comunhão
com Deus. Como explicamos o que nos relata a Bíblia Sagrada, como também o
testemunho acima citado pelo Pastor José Dantas Filho. No Ensino calvinista diz
que se uma pessoa cai em apostasia ou não mostra mais sinais de arrependimento
genuíno, pode ser prova de que nunca foi salvo, e em seguida, que não fazia
parte do numero dos eleitos e é realmente assim que nos ensina varias doutrinas
bíblicas principalmente em Romanos e Efésios.
Contudo o oitavo item do nosso sistema doutrinário diz
que nós cremos: Na missão soberana e pessoal do Espírito Santo, no
arrependimento, na regeneração e na santificação dos genuínos cristãos e
citamos justamente textos que nos levam para uma proposta de santificação
progressiva, e até dizemos que temos a obrigação de realizarmos boas obras
porque somos salvos e não para nos salvarmos. Jo 3.3-7; 16.7-11 II Co 5. 17; Ef
1.13-14 e Tt 3.5; podemos citar vários outros textos.
O escritor Carlos Pinheiro Queiroz ao escrever As Faces
de um Mito, na Pg. 85 a 93, relata a cerca das convicções doutrinárias de João
Vicente de Queiroz um dos pioneiros e fundadores da igreja: diz o seguinte. Em
1932, foi um ano de fortes mudanças, foi neste ano que João Vicente de Queiroz
tomou a decisão de sair da Assembleia de Deus, ainda no mês de junho. Sua
leitura bíblica abria horizontes para entendimento da salvação numa ótica
calvinista, embora não conhecesse praticamente nada sobre a história e
postulados doutrinários de Calvino. O enfoque de João Vicente Queiroz nesse
aspecto envolvia tão somente a doutrina da salvação. Para ele e para nós hoje: O
crente, uma vez salvo, salvo para sempre. Os contrários a essa doutrina
atribuíam na época a mudança de João Queiróz a influencia do Pastor Manoel
Higino de Souza durante a visita que João Vicente de Queiroz fez ao Pr. Manoel
Higino de Souza no interior do Rio Grande do Norte principalmente em Mossoró.
Foi nesse cenário que ambos se conheceram, Manoel Higino de Souza a inda na
Assembleia de Deus no ano de 1931.
João Vicente de Queiroz recebeu as orientações de Manoel
Higino para acompanhar alguns protestantes no pequeno povoado do Moreno no
município de Carnaúbas. Há informações de que Manoel Higino era um Homem muito
ungido, conhecedor das Escrituras. Trocou com Queiroz suas ideais sobre a salvação
eterna do crente genuíno. Havia uma espécie de casamento entre o aspecto
prático de Queiroz perceber esse tema com a sistematização de Manoel Higino de
Souza. Mas não é só isto. João Vicente de Queiroz como também, Eustáquio Lopes
da Silva e Manoel Higino de Souza tiveram esse contato mais profundo com os
protestantes presbiterianos.
Na verdade Manoel Higino de Souza quando chegou a
Mossoró teve esse contato com alguns cristãos de origem presbiterianos na
cidade de Mossoró. João Vicente de Queiroz também teve esse contato com as
escrituras, mas também com os presbiterianos no Estado do Ceará e quando chegou
ao Rio Grande do Norte, com Manoel Higino de Souza. Assim aconteceu com
Eustáquio Lopes da Silva. Veja o depoimento de João Vicente de Queiroz: no
mesmo ano conheci Pastor Eustáquio Lopes da Silva, homem de pele negra, filho
de escrava, talvez o mais dedicado á leitura entre os obreiros da igreja na
época. Manoel Higino e Eustáquio Lopes da Silva sistematizavam bem melhor do
que eu o tema que Santo Agostinho chamava de justificação pela fé sem o
concurso do mérito próprio.
Ele prossegue dizendo Manoel Higino de Sousa e Eustáquio
Lopes da Silva eram muito queridos em todos os lugares que passavam. João
Vicente de Queiroz já tinha algumas ideias sobre a salvação do crente genuíno,
mas não com a mesma facilidade dos dois. Foi no encontro que teve em Mossoró
que trocaram muitas ideias sobre o assunto, João Vicente de Queiroz
aprofundou-se sobre a doutrina da justificação pregada por Santo Agostinho, seguida
por Lutero e Calvino, é nesse contexto das Igrejas históricas que surgimos como
igreja de Cristo no Brasil.
Nesse contexto a Igreja de Cristo é uma denominação de
moldura pentecostal, fundada no Nordeste brasileiro, em Mossoró Rio Grande do
Norte no dia 13 de dezembro do ano de 1932. O seu surgimento dá-se em função de
uma dissidência na Assembleia de Deus, e por questão doutrinária é uma igreja
genuinamente nordestina, historicamente caracteriza-se como a primeira igreja
evangélica nativa brasileira, é uma igreja com características singulares, foi
à terceira denominação pentecostal que se estabeleceu no país, a primeira
denominação protestante a ser administrada por uma liderança totalmente
brasileira e nordestina.
Foi também a primeira igreja produto de uma dissidência
dentro do pentecostalismo nascente do Brasil. No segundo concílio da igreja de
Cristo no Brasil, realizado em Mossoró-RN o Concílio que participou vários
obreiros, eles tomaram uma decisão importante sobre dois temas como o batismo cristão
que não deveria se repetir mesmo tendo sido batizado por aspersão á não ser
quando o batizando reivindicasse por imersão. Como vimos também quando era
celebrada a Ceia do Senhor esses dois sacramentos deveriam ser mantidos pela fé
e pelo amor. Eles aprenderam com Goodman segundo o relato de Manoel Higino de
Souza no segundo Concílio. Estudos bíblicos da Igreja Presbiteriana 16 de
dezembro de 1934 Pg. 192.
A igreja de Cristo no
Brasil é uma Igreja que tem uma construção doutrinária, o Doutor e Pastor
também sociólogo, Alexandre Carneiro, relata em sua tese de Mestrado com o
título A Trajetória da Luta Pelo Poder no Pentecostalismo o caso da Igreja de
Cristo no Brasil Pg.88. Relata que a Igreja de Cristo no Brasil incorpora o
ethos protestante reformado e convercionista.
Ao pesquisar sobre esse
tema vejam o que encontramos de comentários sobre o principal líder e outros
que construíram a nossa Igreja e doutrina. João Bosco de Sousa 2007 diz que os
dois primeiros grupos pentecostais estiveram sozinhos até 1932. Até que um dos
maiores expoentes da Assembleia de Deus o Pastor Manoel Higino de Sousa por
divergências internas sai da Assembleia de Deus e Organiza em Mossoró no Rio
Grande do Norte a Igreja de Cristo no Brasil.
Já no Site da missão
sueca no Brasil comenta: no início dos anos 30, nasceu no Nordeste do Brasil a
Assembleia de Cristo, formada por obreiros nacionais entre eles Manoel Higino
de Souza, que passaram a crer que “uma vez salvo, salvo para sempre”, e
continua um obreiro nacional leu um panfleto calvinista e começou a ensinar que
aquele que aceitasse a Cristo não tem possibilidade de perder a salvação. Em outro
comentário encontramos o seguinte: que na convenção de 1933, houve a exclusão
dos pastores Adriano Nobre de origem presbiteriana e Manoel Higino de Souza por
se envolverem com novas doutrinas.
Num outro Site
encontramos esse comentário: talvez o mais importante cisma tenha ocorrido em 1932,
os Pastores Manoel Higino de Souza, e João Vicente de Queiroz, entre outros,
saíram em defesa da salvação incondicional, proposta pelo calvinismo,
divergindo da Maioria dos missionários suecos. A negativa do Missionário Nils
Kastberg, quanto ao pedido da realização de uma convenção para tratar do tema,
resultou na retirada dos adeptos do calvinismo para fundar a Assembleia de
Cristo mais tarde, Igreja de Cristo no Brasil muito presente no Ceará.
É nesse contexto que
nasce a Igreja de Cristo no Brasil, uma igreja em que Seu sistema doutrinário é Bíblico Reformado e Calvinista.
Este texto é parte do livro; Biografia da Igreja de Cristo no Brasil no contexto da evangelização brasileira escrito pelo pastor José Egberto Sátiro de Moura.
Graça e Paz! Irei postar este texto no Blog da ICB em Campina Grande http://icbcg.blogspot.com.br/
ResponderExcluirMuito bom...
ResponderExcluirA base de fé da ICB defende que a salvação não pode ser perdida, mas isso não é a mesma coisa que endossar a predestinação calvinista. Não há nada nas bases de fé que afirme que Deus escolheu uns para a salvação e outros para condenação. Apenas que, se alguém foi realmente alcançado pela Graça, esta é poderosa para completar a obra de salvação nesta pessoa.
ResponderExcluirÉ interessante afirmar aqui que a IGREJA DE CRISTO NO BRASIL desde os seus primórdios até o presente tempo, jamais arvorou a bandeira calvinista e tão pouco arminiana. Nossa base ideo-teologica repousa sobre a interpretação direta dos textos sagrados, por parte dos nossos pioneiros, que resultou (sem previsao), neste ponto de equilíbrio entre as igrejas defensoras do calvinisno e as que defendem o arminianismo.
ResponderExcluirÉ interessante afirmar aqui que a IGREJA DE CRISTO NO BRASIL desde os seus primórdios até o presente tempo, jamais arvorou a bandeira calvinista e tão pouco arminiana. Nossa base ideo-teologica repousa sobre a interpretação direta dos textos sagrados, por parte dos nossos pioneiros, que resultou (sem previsao), neste ponto de equilíbrio entre as igrejas defensoras do calvinisno e as que defendem o arminianismo.
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